segunda-feira, 21 de maio de 2007

Madame Bovary

Romance ‘Madame Bovary’, de Gustave Flaubert, completa 150 anos mostrando eternas buscas femininas: a paixão e o consumo fashion

Kamille Viola

Rio - Em ‘Pecados Íntimos’, Sarah, interpretada por Kate Winslet (papel que lhe rendeu indicação ao Oscar), é uma mulher entediada com sua vida e o casamento, em busca da felicidade. Pensa encontrá-la ao se envolver com Brad (Patrick Wilson), também casado. Em uma cena, ela participa de roda de leitura sobre ‘Madame Bovary’, de Gustave Flaubert. Sarah defende a protagonista, Emma, como alguém que pelo menos tentou ser feliz e, enquanto são lidos trechos do romance, lembra de momentos seus com o amante.

Sarah é uma espécie de Bovary dos dias de hoje. O livro de Flaubert, publicado há 150 anos, conta a história da mulher que se casa com Charles, um médico sem grandes ambições, e vai viver com ele numa pequena cidade francesa. Emma, que cresceu lendo sobre grandes amores e príncipes encantados, entedia-se com sua vida. Tenta buscar em amantes e no consumo desenfreado a felicidade com que sonhou, mas não encontra.

Em fevereiro de 1857, Flaubert, o editor e o diretor da revista foram processados por ofensa à moral e à religião. Absolvido, o autor publicou o romance em livro, lançado em abril daquele ano, que se tornou um sucesso através dos tempos. “O mais interessante no livro é a forma de o Flaubert escrever, grande perfeccionista”, elogia o autor Gilberto Braga. “Ela se endividou para se mostrar à sociedade. Comprar servia como alento, terapia”, diz a designer e pesquisadora de moda Paula Acioli. “Há quem a critique pelo gosto pela moda e pelo consumo. Mas é uma mulher que tentou vencer as limitações impostas pelo modelo do século 19”, explica a professora e pesquisadora de História da Moda Silvia Helena Soares. “O espaço público era para o homem e o espaço privado, para a mulher”, emenda Silvia. Emma Bovary é uma mulher de personalidade, com características consideradas masculinas na época. Daí a frase do autor: “Madame Bovary sou eu”.

Em comemoração pelos 150 anos da primeira publicação, exposição com 400 quadros inspirados em Bovary, feitos em diferentes épocas, foi inaugurada mês passado e vai correr a Europa, os Estados Unidos e o Japão. O livro, já publicado em inúmeras línguas, ganhou edições comemorativas em diversos países, inclusive no Brasil — com versão pocket pela editora LP&M.

CELESTE DE ‘BOCA DE OURO’: BOVARY

VERSÕES
"Madame Bovary" foi adaptado para o cinema diversas vezes: por Jean Renoir em 1933, por Vincent Minelli em 1969 e por Claude Chabrol em 1991, com Isabelle Huppert no papel de Emma, entre outras versões menos conhecidas. Também originou séries de TV na Europa, peças de teatro e inspirou quadros e até história em quadrinhos.

NACIONAL
No Brasil, não há registro de personagens da teledramaturgia que sejam parecidas com Emma Bovary. Mas no teatro, sim. “A Celeste da peça ‘Boca de Ouro’, de Nelson Rodrigues. Aliás, o Nelson às vezes falava em chamar alguma peça de ‘A Bovary dos Subúrbios’”, conta Gilberto Braga.

MODA
O romance foi um dos primeiros a dar importância à moda. “O autor usa muito a descrição da roupa para falar de um personagem”, conta Silvia Helena Soares. “Ela também é mostrada através da sedução pela novidade. Flaubert usa a moda como sedução”, diz Silvia. Isso porque, fascinada por compras, Emma acaba se endividando e passa a sofrer chantagens de seu credor. “Flaubert mostra o fascínio que Emma Bovary tem pela moda, os acessórios, a joalheria. O consumo era onde ela conseguia realizar o que sonhava”, explica ela. “A personagem encontrava segurança na aparência. Como muitas Bovarys até hoje fazem: vão para o shopping compensar suas frustrações e angústias. É impressionante como o livro é atual”, completa Paula Acioli.

Felicidade

“Antes de casar ela julgara ter amor, mas como a felicidade que deveria ter resultado daquele amor não viera, ela deveria ter-se enganado, pensava. E Emma procurava saber o que se entendia exatamente, na vida, pelas palavras "felicidade", "paixão", “embriaguês”, que lhe haviam parecido tão belas nos livros”.

“Ela o encantava com grande número de delicadezas; ora uma nova maneira de fazer arandelas de papel para velas, um babado que mudava no vestido ou o nome extraordinário de um prato bem simples que a empregada não acertara, mas que Charles engolia até o fim com prazer”.

Fonte: O Dia Online: http://odia.terra.com.br/cultura/htm/geral_99434.asp

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